segunda-feira, 15 de julho de 2013

Rajoy, Coelho ou Portas – quem sai primeiro?

Pim, pam, pum
Pim, pam, pum
Cada bola mata um
Da galinha p’ró perú
Quem se livra és tu!
 
Criação de Augusto Santa-Rita
 
O dirigente francês da Frente de Esquerda, Jean-Luc Mélenchon, descrê de uma crise do capitalismo e prefere opor-lhe o conceito de «bifurcação». Define-o como uma «dinâmica» interna do sistema, opondo a opção conservadora, inerente a todas as sociedades, à da ruptura, que mobiliza a vontade individual. Daí afirmar que «há uma falsa oposição entre o conceito de cidadão e de proletário», pois os cidadãos que fazem os movimentos de protesto em Istambul ou em São Paulo vêm da mesma classe social que na fábrica se organiza em sindicatos.
É uma análise interessante, a que o jornal i dá largo eco na sua edição de 15/7/13 e de que se retiram alguns excertos em Registos de leitura. Revela-se frontalmente contrário ao ideário social-democrata, que qualifica de «tóxico» e aconselha «os camaradas do Bloco de Esquerda e do PCP» a cortarem pontes com o PS, para evitar caírem num «canto das sereias». Dito pelo próprio: «Os portugueses podem pensar que votando na social-democracia garantem uma alternativa. Pessoalmente desaconselhar-lhes-ia essa ilusão».
A crer nas declarações do secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, e dos coordenadores do BE, João Semedo e Catarina Martins, os conselhos de Mélenchon foram aceites.
Disse Jerónimo de Sousa: «O PS tem o direito e a liberdade de se juntar com quem quiser, não pode é pedir ao PCP que se junte àqueles que realizaram esta política de direita que tanto mal fez ao nosso povo».
Disse Catarina Martins: «Mais cedo do que tarde o Partido Socialista terá de se definir. Se quer uma nova política ou se quer negociar a manutenção da mesma política de austeridade».
Estas proclamações, mais do que declarações, foram proferidas no mesmo dia em que o líder parlamentar do PS, Carlos Zorrinho, indicou que o seu grupo parlamentar ia votar a favor da moção de censura de Os Verdes, na próxima quinta-feira: «O PS tem vindo, com toda a naturalidade, a censurar o funcionamento deste governo esgotado e falhado. Apresentámos, aliás, há cerca de dois meses uma moção de censura e é por isso com toda a normalidade que vamos votar a favor da moção de censura pelos Verdes».
O Expresso, na sua edição deste último sábado dava conta de que a mais recente sondagem revelava a seguinte projeção de intenção de voto: PS – 37%; CDU – 12%; BE – 8%; PSD – 25%; CDS – 8%. Seguindo os conselhos de Mélenchon, as próximas legislativas, que serão antecipadas e podem realizar-se ainda este ano, serão ganhas pela coligação de direita, que somada faz 33%. Do outro lado fica uma maioria de 57%, que desde o 25 de Abril se define como de «povo de esquerda», mas ainda não compreendeu a «bifurcação» que lhes é proposta pela direção do PCP nem do BE.
Apesar de Mélenchon considerar prioritária a queda do presidente socialista francês, F. Hollande, quem está mesmo na corda bamba é o primeiro-ministro da direita espanhola, Mariano Rajoy, acusado pelo antigo tesoureiro do Partido Popular espanhol, o «multimilionário Luís Barcenás», na qualificação do El País, de ter recebido milhões de pesetas e euros, ao longo de 20 anos, escondidos em caixas de charutos e envelopes, para fugir ao fisco. Dinheiro vindo de empresários, esperando uma contrapartida para o êxito dos seus negócios.
Uma situação a que a súbita reivindicação de cem milhões de euros ao Estado, por parte do BIC, de Mira Amaral, dá grande acuidade. Segundo o que Cristina Ferreira escreveu no Público de segunda-feira (15/7/13) «O BIC Portugal reclama do Estado reembolsos no valor de cerca de 100 milhões de euros, relativos ao BPN, e que estão relacionados com as contingências decorrentes do acordo de privatização celebrado em Março de 2012». Recorde-se que o BPN foi vendido por 40 milhões de euros ao BIC, em condições fixadas pelo próprio BIC.
O desfalque do BPN está estimado em mais de 6,3 mil milhões de euros. O assunto anda em trânsito nos meandros dos tribunais desde 2008, ano em que o banco de Oliveira e Costa, Dias Loureiro e outros antigos ministros dos governos de Cavaco Silva foi à falência e, para evitar o «risco sistémico», foi nacionalizado pelo executivo governamental de José Sócrates.
Os meandros da privatização e posterior venda do BPN ao BIC, que envolvem estes prémios de cem milhões de euros a posteriori, são explicados na peça jornalística de Cristina Ferreira, de que se cita o comentário que a acompanha, igualmente da sua autoria.
 
Um banco no centro de teias partidárias
 
As interrogações à volta do BPN têm sido uma marca que o acompanha desde o início da década passada. O debate acendeu-se com a estatização e a decisão de injectar fundos públicos, em plena crise, para salvar um banco. As dúvidas agudizaram-se quando se ficou a saber que a instituição tinha sido alvo de uma mega-fraude levada a cabo pela administração.
Para além das más práticas de gestão, das suas relações promíscuas com os accionistas, a forte ligação do banco ao universo partidário fez com que a nacionalização tivesse repercussões políticas. Vários dirigentes do PSD, assim como ex-governantes do universo social-democrata foram recrutados para a esfera do BPN, com alguns a desempenharem um papel determinante na vida da instituição.
Os casos mais emblemáticos foram os de José Oliveira Costa, ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do actual Presidente da República, e o de Dias Loureiro (gestor e accionista), ex-conselheiro de Estado e ex-ministro da Administração Interna de Cavaco Silva. Mas nos corpos sociais do grupo SLN/BPN pontuavam outras personalidades como Rui Machete, ex-ministro da Defesa e ex-vice-primeiro-ministro de um governo do bloco central, ou Daniel Sanches, ministro da Administração Interna de Santana Lopes.
Entre os clientes e accionistas da SLN/SLN com ligações ao PSD estão Duarte Lima (deputado, vice-presidente do PSD, assessor politico do ex-ministro Ângelo Correia), Arlindo Carvalho (ex-ministro da Saúde de Cavaco), Joaquim Coimbra, da direcção social-democrata. Ou a própria família Cavaco Silva. Antes de se candidatar a Belém, Cavaco e a filha venderam as acções da SLN a Oliveira Costa com um ganho de 350 mil euros.
Mas o dossier BPN tem outra dimensão igualmente controversa. É que os reguladores, o Banco de Portugal e a CMVM não detectaram, ou não perceberam, ao longo de quase dez anos o que se passava na instituição, apesar dos sinais públicos que foram surgindo, em especial, a partir de 2003. E, mesmo perante várias denúncias e avisos que partiram quer da comunicação social, quer de gestores e de auditores externos que se recusaram a certificar as contas do BPN/SLN, os dois supervisores não actuaram.
E se actuaram foi sem consequências.
C. F.
 
Registos de leitura
Excertos da entrevista de Jean-Luc Mélenchon, dirigente do Front de Gauche (Frente de Esquerda) francês ao jornal i de 15/7/13, feita por Nuno Ramos de Almeida.
 
Jean- Luc Mélenchon – foto: António Pedrosa, jornal i
 
A palavra “crise” [do capitalismo] é completamente inadaptada. Não penso que as nossas sociedades estejam numa crise. A ideia de crise dá a entender que é possível regressar à situação que tínhamos antes. Ora aquilo que se produziu não permite que regressemos ao ponto que estávamos antes da “crise”.
O conceito de bifurcação é mais rico que o conceito de crise, porque tem em conta a dinâmica do sistema e liberta-nos de todo o tipo de explicações sofisticadas, como as que recorrem à dialéctica, que sempre me pareceram metafísicas, como a ideia da transformação da quantidade em qualidade.
Há camaradas que só imaginam a classe social na fábrica. Quando o mesmo trabalhador está na rua a defender os transportes públicos acessíveis, o direito à habitação ou a qualidade da água, diriam que ele já não é um trabalhador. Mas claro que continua a ser um trabalhador. E é justamente porque é um trabalhador e um assalariado que defende um salário digno e tem uma exigência sobre a existência e a qualidade dos serviços públicos. Penso que há uma falsa oposição entre o conceito de cidadão e de proletário.
Se pensamos em termos de revolução cidadã temos uma boa bússola para governar de outra maneira, para aprofundar uma partilha mais radical de riqueza no país, Dilma Rousseff não a pode realizar sozinha, deve apoiar-se neste movimento. Não deve limitar-se a convocar gente para falar com ela no quadro actual, mas convocar uma Assembleia Constituinte e eleger deputados para decidirem as regras do jogo.
A política europeia aparece como uma conjugação dos interesses do capital financeiro com um governo específico da Alemanha, o da CDU/CSU, que é resultante da situação da Alemanha, da sua história, da reunificação da Alemanha, junto com um parâmetro que é o envelhecimento da população (…)
Os portugueses podem pensar que votando na social-democracia garantem uma alternativa. Pessoalmente desaconselhar-lhes-ia essa ilusão. A única maneira de fazer mexer a social-democracia é a outra esquerda ultrapassá-la nas urnas.
sem os nossos 4 milhões de votos Sarkozy não teria sido vencido: a derrota foi por um milhão de votos. Fomos nós que demos a vitória a Hollande. Em qualquer regime democrático do mundo, aquele que ganhou leva em conta os votos que o ajudaram a triunfar. Aqui, no momento preciso em que ele ganhou, divorciou-se daqueles que o elegeram, e o divórcio toma a forma da rejeição brutal e violenta da Frente de Esquerda.
A estratégia de combate político não pode ser senão tentar unificar todos os sectores que se opõem à política de austeridade em torno da Frente de Esquerda para conseguirmos ultrapassar os socialistas. É um combate permanente, esperamos brevemente ver os ecologistas juntarem-se a nós contra estas políticas de austeridade.
são muito difíceis as condições em que nos batemos. É preciso ter em conta o nosso ponto de partida. A relação de um partido com um povo constrói-se no tempo e com a experiência. O que se passa é que aquilo que se chama esquerda tem um produto tóxico, e este produto tóxico é a social-democracia.
É uma realidade que pode desaparecer em dez dias [o euro]. Basta Portugal não pagar e temos uma crise que pode levar ao fim da moeda única. Sobre isso podemos apelar ao exemplo de Diógenes quando vários filósofos discutiam há horas se o real existia. Diógenes arranja um tronco de árvore, chega e começa a bater em todos e diz: “É este o meu argumento.” Podemos discutir o euro durante horas, mas enquanto o fazemos ele pode pura e simplesmente afundar-se e por uma razão não prevista.
Resumindo, este euro não tem condições para se aguentar. Agora resta saber se é conveniente que se aguente. Para o seu futuro é determinante quem vai estar no poder na Europa, quem vai poder fazer um contraponto à política alemã. É completamente diferente um continente em que, por exemplo, em França, na Grécia e em Portugal possam ser eleitos governos verdadeiramente de esquerda.
 
ANTÓNIO MELO


 

 


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