Perante a constante
subida das taxas de desemprego (Em Portugal, já ultrapassa os 17,5%), parece-me
útil e urgente dar um saltinho ao passado, como ponto de partida para uma
reflexão que precisa de ser feita.
Podemos dizer que, até ao séc. XVIII, o trabalho assenta essencialmente na utilização de mão-de-obra escrava ou servil, sem direitos, condenada ao desprezo, à vergonha e a um estatuto de inferioridade.
Os grupos privilegiados (Nobreza e Clero) viviam nobremente, o que quer dizer dos rendimentos da muita terra de que eram proprietários, do serviço de Deus ou do Estado; enquanto a Burguesia enriquecia com os lucros do comércio, sobretudo a partir do séc. XVI, com a expansão do comércio marítimo.
O trabalho era, portanto, o trabalho manual, considerado como desprezível.
O Iluminismo (séc. XVIII), tendo como base as ideias de filósofos como Montesquieu, Rousseau ou Voltaire, vai alterar essa concepção com a defesa da liberdade, dos direitos e igualdade dos indivíduos e, até, da soberania popular.
São esses os ideais da Revolução Francesa (1789), que se difundem no mundo ocidental e elevam, pelo menos teoricamente, camponeses e artesãos ao estatuto de cidadãos e, por conseguinte, lhes reconhecem a dignidade que antes lhes era negada.
Mas não pensemos que melhoraram as suas condições de vida.
Associada a esta
transformação está a revolução
industrial, que cria actividades e necessidades novas, levando grande parte
da população dos campos a mudar-se, para as cidades, onde vai trabalhar nas
fábricas e viver em condições tão ou mais miseráveis do que as que tinha antes.
Durante o séc. XIX,
são frequentes os relatos das condições deploráveis em que viviam os agora operários.
Afastados das suas origens, vivem em bairros de lata ou caves sem o mínimo de
condições; trabalham muitas horas e recebem salários baixos. As mulheres e as
crianças são ainda mais exploradas por patrões sem escrúpulos ou compaixão.
O triunfo do Liberalismo é o triunfo da burguesia. A sociedade burguesa é feita
de contrastes. De um lado, a elite burguesa que domina a economia e a política;
do outro, a miséria do proletariado.
E, se os operários
cedo iniciam a revolta, primeiro de forma espontânea e logo organizados em sindicatos; aparecem muitos pensadores,
que defendem uma sociedade mais justa onde não exista “a exploração do homem
pelo homem”. Dos chamados socialistas
utópicos aos marxistas, é da
luta por uma sociedade mais justa e mais igual que se trata.
A Revolução Soviética e a Crise dos Anos 30, contribuíram para que alguns países enveredassem pela Social-Democracia que, a par de uma maior intervenção do Estado na economia (para limitar os abusos do capitalismo), procurava o estabelecimento do equilíbrio entre as classes por meio de reformas sociais, promovendo a elevação das condições de vida dos trabalhadores.
Picasso.Pobres à beira-mar
Quer tudo isto dizer
que a caminhada dos trabalhadores tem sido árdua, sofrida, feita de revoltas e
de luta.
O chamado Estado
Social, não sendo perfeito, garantiu a protecção possível aos trabalhadores e
aos mais vulneráveis da sociedade. Foi um avanço civilizacional extraordinário.
Sabemos, agora, que aquilo que tomámos como adquirido, está em perigo.
Entretanto, fomos
deixando que o capitalismo financeiro
se instalasse e ditasse a lei, cego pela ganância, indiferente ao mal que
provoca.
Eles, os senhores do
dinheiro, foram influenciando políticas que servissem os seus interesses (como
a globalização sem regras), que destruíssem as nossas capacidades produtivas,
para nos reduzirem à categoria de indigentes que acabarão por aceitar a tal
“tigela de arroz” como paga do seu trabalho. Aliás, não precisam de nós,
enquanto tiveram os milhões de chineses, indianos e outros a fazê-lo.
Dizem que a situação
mudou e que temos de nos adaptar.
Cá por mim, não
quero adaptar-me. Quero é que eles percebam que estou aqui, e não sozinha com
toda certeza, para os enfrentar, para os combater, para lutar pelo que
considero justo e bom, honrando os trabalhadores que nos precederam. Não fazer
isso era tornar inútil a luta que travaram.
Mas será que isto
basta? Não, não basta.
Não podemos ignorar
que a evolução tecnológica dispensa, cada vez mais, o trabalho humano. E temos
de pensar o que fazer com esta evidência.
Não encontro solução
que não passe pela resposta a esta pergunta: Qual deve ser o fim último de todo
o nosso esforço?
Talvez esta seja
a resposta mais difícil de encontrar.
Será, porventura, necessário repensar todas as bases
em que assenta a nossa sociedade e a vida de cada um de nós.